Saturday, May 23, 2020

Os Mistérios de Lisboa, de Raul Ruiz: A Minissérie de Televisão na Íntegra [Portuguese Translation]


I’m thrilled again to have a Portuguese translation of my review of Raul Ruiz’s The Mysteries of Lisbon (the full miniseries version), courtesy of Angelica Sakurada. Ruiz was a Chilean expat, who worked extensively in Portugal. Many of his cast-members have also frequently appeared on Brazilian television, so it is definitely a production with international appeal. (You can find my original here.)

Na sociedade elegante portuguesa do século XVIII, todos eram ou parentes distantes, amantes ardentes, ou rivais jurados, por vezes até dois dos três. Todos que eram alguém terão os seus próprios flashbacks, pelo menos um para cada uma das suas antigas identidades. Este é um conto épico de paixão, escândalo, e retiro para ordens religiosas que deve soar familiar. Oito anos após o lançamento do filme teatral de quatro horas e meia, a minissérie de televisão com seis horas de Raul Ruiz, Os Mistérios de Lisboa, foi lançado virtualmente nesta sexta-feira em Nova Iorque.

Apesar de terem sido produzidas ao mesmo tempo, as cenas do filme e da televisão foram concebidas para serem bem diferentes e consistentes uma com o outra. Ambos possuem cenas que são exclusivas a eles. Foi anunciado que Raul Ruiz também alterou a sua proposta de narrativa. Faz já um certo tempo desde que eu cobri o filme original, mas segundo a minha memória, os personagens tinham seus retornos surpresas que são melhores estabelecidos na série televisiva (ainda que esse tenha sido o charme do filme).

De qualquer modo, ainda há bastante charme nas cenas das seis horas, que explora mais completamente a profundidade das emoções fortes sentidas pelos personagens (eu acho). Independente disso, é muito fácil ser envolvido novamente nas suas agonias e êxtases (de novo), especialmente se já fizer anos desde que você tenha assistido a outra encarnação, ou se você nunca teve o prazer de assistir.

Ostensivamente, Pedro da Silva é o herói de Mistérios de Lisboa e é o narrador da história. Quando nós o conhecemos pela primeira vez, ele é um órfão triste conhecido somente como “João”. Entretanto, ele vai ser ofuscado enormemente por dois homens misteriosos, que vão determinar diretamente o seu destino. Um é o virtuoso Padre Diniz, que seve como o protetor do João jovem e vai ser um personagem decisivo defendendo a honra de sua mãe que ele nunca conheceu, Ângela de Lima, a esposa do abusivo Conde de Santa Bárbara. O outro é o Alberto de Magalhães, um mercador brasileiro (pirata talvez seja o mais exato), ou pelo menos é como ele se autodenomina agora. Passarão anos até que Pedro da Silva o encontre cara-a-cara, mas o aventureiro picareta forjará uma aliança informal não muito usual com Padre Diniz.

Tenho que admitir que existem uma série de fatores de coincidências nas ambas versões de Mistérios de Lisboa, mas é de se esperar de qualquer coisa que seja baseada em uma novela grandiosa do século XIX. Realmente, é destes cruzamentos do destino que surge a diversão de assistir a história. Tudo é conectado e o carma faz jus a sua reputação, de modo gloriosamente trágico.

Ambos Mistérios de Lisboa também parecem pinturas à óleo que podiam ter sido produzidas por uma das academias de arte da época. A composição visual de Raul Ruiz por muitas vezes oferece perspectivas inteligentes da hierarquia social daqueles tempos e da dinâmica de poderes na sua narrativa (empregados sempre espionando). Esta é uma produção bem ricas em detalhes de época, mas Raul Ruiz produz com uma sensibilidade pós-moderna. Seu padrão de utilizar teatro de fantoches para literalmente definir os momentos de transição é provavelmente mais proeminente no filme, mas ainda está presente na minissérie.

A interpretação de Adriano Luiz como o bom Padre Diniz permanece bem sólida, a âncora humanística de toda a série. Controverso, Ricardo Pereira ganha mais em presença e tempo de cena com sua performance explosiva mas carismática como o ganancioso Alberto de Magalhães (ou quem quer que seja). De qualquer modo, Maria João Bastos (uma atriz portuguesa bastante conhecida também no Brasil pelas novelas O Clone e a série O Mecanismo) permanece com uma presença digna e triste como a mãe de Pedro da Silva sofredora a vida toda. Ironicamente, Pedro da Silva, durante toda o seu estágio de amadurecimento, é a figura menos interessante de todos os personagens da série, em comparação ao que ele era no filme.

Os Mistérios de Lisboa é um drama histórico grandioso que realça a elegância e obra de um verdadeiro mestre cineasta. O drama combina um refinamento do mundo antigo com as atitudes do mundo novo, mas de modo que nunca se conflitem. Bastante recomendada, a ainda mais longa minissérie Os Mistérios de Lisboa lançou virtualmente em Nova Iorque nesta sexta-feira (22 de maio), com lançamentos virtuais a seguir em Los Angeles, Chicago e Seattle, antes do lançamento em VOD em 2 de julho.